A esta altura do campeonato, até eu já estou sabendo do que ocorreu no Big Brother: estupro, puro e simples.
Não vou repetir a mesma (e verdadeira) ladainha: o programa é horroroso, existe praticamente um contrato de fornecimento de capas para a playboy, torna a invasão de privacidade um valor altamente desejável, é uma perigosa implementação dos mecanismos de controle de 1984 (a começar pelo próprio nome) etc. etc. etc. e tal.
Mas no momento em que a emissora decide acobertar o estupro, com direito a um asqueroso “o amor é lindo”, o BBB deixa de ser uma coisa “fútil” e “com a qual não deveríamos perder tempo”, como disse um comentarista no Blog da Morango. Passa a ser um problema geral. Temos 1) uma emissora enorme e altamente capilarizada e com notória influência formadora de opinião 2) expondo um estupro. E ainda, 3) a edição das cenas bota a culpa na mulher, 4) coroado com o “amor é lindo”, típica inversão à 1984.
Ou seja, uma enorme emissora difundindo, capilarizadamente, que estupros só são condenáveis se forem escondidos (e olhe lá), e, bem, a culpa é da mulher mesmo. O efeito multiplicador imediato disso é muito perigoso. O efeito contra-educativo no longo prazo, então, maior ainda. Consigo até imaginar a capa da Veja da próxima semana: “A verdade é que amar é glorioso”, elogiando as conquistas comportamentais femininas, mostrando fotos da Monique divertindo-se e “pedindo” e mostrando que ela conseguiu pegar um gatão da casa…
Assim, ainda que marginalmente, engrosso o coro de repúdio ao estupro e ao seu acobertamento, clamando pela devida investigação criminal. O começo disso é informar a Monique do que realmente aconteceu, pois, vejam só: o fato de o estupro ser crime de ação privada, medida de proteção da privacidade da vítima, acaba condicionando a apuração a uma iniciativa de alguém que, a essa altura, está cuidadosamente desinformada do que aconteceu…
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O dito cujo foi expulso do programa, embora com total abafamento e omissão a respeito dos motivos. Fico me perguntando se essa proteção toda não se deve ao fato de que Daniel ser muito interessante para o posicionamento da Globo sobre cotas, afinal, é negro e é contra. O MP do Rio de Janeiro iniciou uma apuração, com uma linha que eu imaginava, mas da qual não tinha certeza: embora, em regra, o estupro seja crime que dependa de iniciativa da vítima (crime de ação privada), nos casos de estupro de vulnerável, a ação passa a não depender da vítima (crime de ação pública). A justificativa é que, em havendo violência (além da que o estupro já implica), o interesse da sociedade de punir a conduta pesa mais do que o desejo de privacidade da vítima. Vamos ver no que dá.
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